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Vamos mendigar pelo pão
pelo milho, pelo mel
pelo mascavo, pelo favo
Mendigar pelo ócio
Ócio de puro estado mórbido
Estado de amor mudo.
Foto de
Marilia Gomes
Os chãos, os tetos, as luzes e as sombras do Teatro Municipal, meu filho João Caetano – e o público - testemunharam noite de ontem a performance afetuosa e habilidosa de um trio de músicos que não deve nada a ninguém, nem daqui nem de fora: Léo Ferrarini, ao piano, Fábio Alves, no baixo elétrico e acústico, e Marcinho Pereira na bateria e percussão, no lançamento do CD “Batedô”, de Léo Ferrarini, trabalho financiado pelo Fundoprocultura e gravado ali mesmo alguns poucos meses antes, take a take, como os antigos e seminais discos de jazz.
O que se ouviu foi música instrumental calcada em jazz de primeira grandeza, fazendo jus às influências declaradas do pianista na obra de Heitor Villa-Lobos (estava lá o “Trenzinho Caipira”) e Egberto Gismonti (de quem tocou tema centrado em “Forrobodó”) e – pude confirmar minha suspeita conversando com Léo, após o show e durante o vinho – na maravilhosa contribuição do talvez maior dos pianistas de jazz de todos os tempos: o genial Bill Evans.
Parênteses aqui. Léo detém aquela relíquia que faz falta àqueles que só possuem técnica: tem coração, alma, afeto que se evola dos dedos e acaricia o chiaroscuro do piano, daí minha suspeita de que a luz de um Bill Evans pairasse liricamente no ar por sobre nossos chapéus. Dizia-me a amiga Monica Montanari, contribuidora deste blogue aqui, quando o pianista ficou sozinho no palco, que “agora ele esqueceu do show, só está curtindo”. E que honra pra nós poder compartilhar da curtição do artista, público que saiu – pelo menos aqueles com quem conversei – extraordinariamente feliz e tocado pelas mãos sensíveis do trio.
Uma palavra sobre o CD: como se poderia esperar de um trabalho de tão fina tessitura poética, o encarte está primoroso, com a temática do coração e o trabalho gráfico – que foi projetado no palco durante o show - em sintonia com a qualidade da obra musical.
Fábio - já o tinha ouvido antes com Oscar do Reis (que participa também de “Batedô”) e em seu trabalho em rock progressivo - segue em sua trajetória luminosa, com seu contrabaixo luxuoso e de extrema qualidade técnica. E Márcio, uma grata surpresa para nós, porém não para Ferrarini, que o definiu como portador de um talento fora do comum. Foi o que vimos, no mais, dos três músicos à nossa frente.
Esta é uma Obra mesmo, com letra maiúscula. Isso o que esses músicos de primeira grandeza, repito, trazem pra esse nosso tonto mundo, e pra nossos corações desejosos de leveza, alegria e boas vibrações.
Parabéns, Troian e Renata, pelo feito!
Evoé, Léo, Fábio e Márcio! Gracias por existirem!
As fotos são de celular, daí talvez sua baixa resolução, mas são, por assim dizer, de coração.